Nesse nosso mundo globalizado, dois gigantes – o Brasil na América do Sul e a China, na Ásia – guardam relações comerciais importantes e que, de muitos modos, abriram caminho para afinidades expressivas na geopolítica global.
Isso é mais que evidente desde abril de 2009, quando a China ultrapassou os EUA como o principal destino das exportações brasileiras, desalojando para o segundo lugar nosso tradicional comprador e deixando Argentina na terceira posição.
Desde então a China conserva uma posição de liderança inconteste na compra de produtos brasileiros, que atingiu US$89 bilhões em 2021 deixando, como habitualmente, um expressivo saldo favorável para nosso país.
Mas o passado das frutíferas relações entre os dois países guarda uma história notável e que, ainda que esquecida por muitos – notadamente por nossa zelosa burocracia estatal – é um modelo de pioneirismo, visão e arrojo em empresarial.
Tudo começou lá pelo início da década de 1970 quando Horácio Sabino Coimbra, então presidente da Cia Cacique de Café Solúvel, de Londrina, Paraná, colocou a primeira pedra para pavimentar o caminho das relações comerciais entre o Brasil – que mal incursionava nos mercados internacionais – e a China, que já possuía a maior população do mundo.
Eram tempos difíceis. O Brasil suportava a infelicidade de uma ditadura militar e, na frente externa, as grandes potências, EUA e União Soviética, teimavam por deixar o mundo à beira do holocausto nuclear.
Nesse cenário, as “boas empresas” deviam seguir o figurino americano-ocidental – do qual o Brasil fazia parte – evitando contatos e negócios com países comunistas, especialmente com a China, que governada pela mão férrea de Mao Tsé-tung, já ostentava o título de “grande demônio vermelho” e rivalizava com a União Soviética o papel de maior pesadelo do Ocidente.
No Brasil, assim como em qualquer outro lugar do planeta, ninguém imaginaria que um valente empreendedor, quebrando paradigmas e numa prova inapagável de visão, coragem e audácia, em 1971, empreenderia a odisseia de tentar vender produtos industrializados aos chineses, ideologias de lado. Ou seja, um produto com valor agregado, com selo brasileiro.
Era, sob qualquer ponto de vista, uma completa loucura
E não foi que nosso pioneiro fez o aparentemente impossível: Vendeu o café solúvel fabricado pela Cacique, abrindo as portas para o Brasil daquele gigantesco mercado e ainda contribuiu decisivamente para o reatamento das relações diplomáticas, em 1974, entre os dois países, dando início a um trabalho que, no Século XXI, pode ser considerado como a maior façanha geopolítica do país nos últimos 50 anos.
No presente, é quase impossível imaginar as formidáveis dificuldades – políticas, logísticas, culturais, mercadológicas, operacionais e circunstanciais, por dizer o mínimo – que tiveram que ser vencidas para chegar a concretizar negócios na terra do dra gão.
Vale lembrar que, comparativamente, realizar hoje vendas internacionais é quase brincadeira, o que reforça o recado histórico para os que retrocedem frente às dificuldades de vender no exterior. Na China, por exemplo.
O Café Pelé – marca de batismo do café solúvel da Cacique – tinha conseguido a façanha de entrar no mercado chinês abrindo, com essa conquista, novos caminhos para demarcar o amanhã!
Miguel Sainún Nozar